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segunda-feira, 27 de fevereiro de 2012

O MARANHÃO


O Maranhão, pelas próprias circunstâncias históricas de sua fundação, pelos franceses, e colonização, pelos portugueses, foi assinalado para uma grande destinação, a de tornar-se berço de uma elite cultural de privilegiados monstros sagrados, estuários de grandes civilizações helênicas, a Grega e a Romana, possibilitando a construção, aqui e no século XIX, de uma Mesopotâmia cultural ou de uma Alexandria/Atenas, dentro do Brasil, como uma civilização à parte.
É sabido que, não raro, as ilhas-cidades são satélites, concentradoras de saberes, daí tornarem-se os locais propícios para o nascimento dos grandes mitos da Literatura e do Jornalismo. Assim foi em Ítaca e Colofon, ilhas que deram a atmosfera propícia para um Melesígenes ou Homero, a primeira grande expressão da escritura universal.

A Irlanda propiciaria um James Joyce, notável jornalista e escritor. São Luís, a ilha em que nasceram Odorico Mendes, Nascimento Morais e Erasmo Dias e onde houve o descortino vertiginoso da obra jornalística de João Francisco Lisboa.
A matriz desse jornalismo culto, e ao mesmo tempo polêmico, com base no ironicamente contraditório que permite a problematização (e não negação) da História, é o saber de inúmeros saberes.
Qual o mistério que envolve uma ilha-cidade, São Luís, que a tornou tão expressiva, ao ponto de titularem-na de Atenas Brasileira, mais pelo grande Jornalismo que pela Literatura, nos meados do século XIX? O helenismo, a helenização ou essa capacidade privilegiada e paradoxal à qual têm acesso certos escritores e jornalistas insulados ou antilhanos, de superarem o abismo dos oceanos com a centelha do processo alquímico, através da capacidade de dar, aos fatos e notícias mais simples, o sentido da universalidade.

Desse helenismo foram plasmados Odorico Mendes e João Lisboa, no século XIX, para não citar Sotero dos Reis. E essa tocha seria passada aos mestres Nascimento Morais e Erasmo Dias. E estes deixaram descendentes, alguns já passados ao andar de cima e outros ainda imprimindo pegadas nos textos. Nominá-los, excluiria o sabor da decifração aos estudantes. Descendentes e sobreviventes são o influxo da herança heráldica da cultura greco-romana, o que lhes possibilita sobreviverem para além da época em que viveram, os mortos a viverem nos textos.
A herança transmitida por Odorico Mendes tem por base os estudos na Universidade de Coimbra, mas o grande jornalismo polêmico criado por João Lisboa deve-se, em grande parte, à eloqüência retórica dos Sermões do padre Antônio Vieira.

Dessa cultura helenística que se distingue por dois traços marcantes, o conhecimento humanístico e o espírito combativo, polêmico que permitem o exercício da audácia, do arrojo, do desprendimento, da coragem, do desassombro, da inflexibilidade de caráter, nasceu a grande tribuna da imprensa maranhense que não usou e nem usa dois pesos e duas medidas. Daí por que, para celebrar o 49º aniversário de criação e fundação do Jornal Pequeno, pelo saudoso jornalista Ribamar Bogéa, a direção deste Órgão de Imprensa, através de Hilda, Lourival, Josilda, Ribamar, Luiz Antonio, Luiz Eduardo e Gutemberg, viúva e filhos, decidiu marcar a data com um Suplemento, que fosse ao mesmo tempo uma homenagem póstuma aos jornalistas do século XX, que possibilitaram ao povo tornar-se sujeito de seu próprio destino, e aos jornais combativos do Maranhão.

Após discussões e consultas, idas e vindas, houve um consenso na escolha definitiva dos jornalistas, dentre tantos, que resultou nos seguintes nomes: Nascimento Morais, Erasmo Dias, Amaral Raposo, Cunha Santos, Ribamar Bogéa, Bernardo Almeida, Eyder Paes, Bandeira Tribuzi, Othelino Nova Alves, Nonnato Masson, Lago Burnett e Carlos Cunha.

Neles, por eles ou através deles, o Jornal Pequeno e a família Bogéa homenageiam todos os demais jornalistas do século passado e deste, lembrados por quantos, lendo este Suplemento, exclamarem: “Estão faltando Fulano, Beltrano e Sicrano. Eles também são sobreviventes, pois, também conseguiram viver além do seu tempo, se projetando para o futuro.” Certo.
Temos a humildade de reconhecer que este trabalho é um opúsculo, que não tem a veleidade ou pretensão, senão de ser uma partícula do fio da meada, pois seria ignorância sequer cogitar ser este um trabalho completo, já que é, na área jornalística, apenas um furo, portanto um folheto pioneiro.
Temos conhecimento da grande pesquisa que se vem fazendo sobre a obra jornalística do Maranhão e, neste decênio, já foram publicadas algumas peças importantes desse imenso quebra-cabeças, cuja decifração final resultará do resgate nos arquivos e microfilmagens da Biblioteca Pública Benedito Leite, Arquivo Público e Acervos particulares de cada Jornal, dos muitos que existiram e existem no Maranhão.
Dentre os grandes pesquisadores do gênero, se inscrevem os intelectuais, escritores e/ou jornalistas e/ou professores Nauro Machado, Luís Mello, Jomar Moraes, Sebastião Jorge, Benedito Buzar, Nascimento Morais e Jorge Nascimento. A lista é expressiva.
Nauro Machado é autor das obras de pesquisa Erasmo Dias e Noites e 100 Artigos de Nascimento Morais. Recentemente, o professor, jornalista e escritor Sebastião Jorge fez editar mais um de seus livros sobre o jornalismo, Política Movida a paixão, cujo subtítulo é O Jornalismo polêmico de Odorico Mendes. O jornalista e escritor Benedito Buzar também lançou O Vitorinismo no Maranhão. Nascimento Morais Filho e Luiz Mello reúnem as obras completas do mestre Nascimento Morais.
Lembremo-nos com as sábias palavras de Nascimento Morais Filho. “Bogéa revolucionou o jornalismo no Maranhão. Foi o autêntico representante do grande jornalismo no Maranhão do século XX. OJornal Pequeno é um jornal das massas populares. Veio para contrariar o jornalismo da classe média alta, impondo-se contra os jornais das conveniências; popular e em defesa dos menos favorecidos. É uma tribuna livre.” 
Sim, até para dar leveza aos problemas do dia-a-dia, Bogéa criou as colunas satíricas e humorísticas de grande repercussão em todas as camadas sociais. A exemplo tivemos: Aula do Professor Borracheira, Língua de Trapo, Espírito de Porco e No cafezinho.

O espírito de O Argos da Lei, criado em 1925, por Odorico Mendes, não morreu. Sempre haverá os Garcias de Abranches e novos “censores maranhenses” para gerar polêmica. Lendo os jornalistas deste ensaio, temos a certeza disto.
Alberico Carneiro
São Luís, 25/05/2000

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