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terça-feira, 13 de março de 2012

JORNALISTAS MARANHENSES - BERNARDO ALMEIDA


BERNARDO ALMEIDA


Bernardo Almeida foi o nome literário e jornalístico de Bernardo Coelho de Almeida, que nasceu em São Bernardo, MA., em 13 de junho de 1927. Em 1938, já estava em São Luís, como seminarista, no Seminário de Santo Antônio, de onde passou ao Colégio Maranhense dos Irmãos Maristas. Transferiu-se de São Luís para Parnaíba-PI e depois para Fortaleza-CE, onde continuou os estudos, tendo concluído o curso secundário, no Liceu Maranhense, em São Luís. Escritor, poeta, romancista e cronista. Jornalista, iniciou-se na imprensa, escrevendo no Jornal do Povo, tendo escrito em outros jornais como em O Imparcial, onde semanalmente assinava uma crônica na seção “Ponto de Prosa”. Atuou, tambén, nos jornais O Estado do Maranhão e Jornal Pequeno.

Suas crônicas, lia-as, em um programa da Rádio Difusora, ao meio-dia, “Difusora Opina”, em algumas delas escritas, para esse programa, pelo saudoso jornalista Válber Pinheiro. No Rio de Janeiro e em Volta Redonda, trabalhou na Companhia Siderúrgica Nacional. Em 1950, de volta a São Luís, participa da campanha política das Oposições Coligadas. Foi deputado estadual por três legislaturas, uma voz eloqüente na tribuna. Gerencia a Tipografia São José, em 1955, quando trouxe de volta ao público o jornal O Maranhão. Fundador da revista Legenda. Durante muitos anos trabalhou na Rádio Difusora e, posteriormente, na TV Difusora. Foi adido cultural na Embaixada do Brasil, no Peru, professor do Centro de Estudos Brasileiros de Lima. Presidente da Fundação Cultural do Maranhão, sub-chefe do Gabinete Civil do Governo João Castelo, membro do Conselho de Contas dos Municípios e da Academia Maranhense de Letras. Autor de livros como Luz! Mais Luz!, poesia; A gênese do Azul, poesia; Galeria, crônicas; A última promessa e Bequimão, romances; Éramos felizes e não sabíamos, crônicas.

Morte nas ruas

Bernardo Coelho de Almeida
(O Imparcial, 09/02/96)

Alérgico à violência, mesmo assim não me sinto a salvo de seus efeitos nefastos, embora estes não me atinjam diretamente. Saio muito pouco. Não tenho vida noturna, como antigamente. Afinal consegui o que queria: criar o hábito da leitura, graças à necessidade de pesquisar a obra literária de quase uma centena de escritores, na seleção daqueles que integrarão a Antologia dos Prosadores Maranhenses (de 1612 a 1995), ao mesmo tempo que, nesse árduo oficio de garimpagem, praticado com o máximo critério de aquilatação de valores, cabe-me escrever a introdução e os pequenos textos biográficos de cada autor antologiado.

Leitor assíduo e colaborador de O Imparcial, chocou-me, profundamente, a trágica notícia da morte na rua de uma garota de sete anos, chamada Wanessa. No clichê, que ilustra a matéria sinistra, vejo a mãe a abraçar o corpo despedaçado da filhinha, graças ao registro do repórter onipresente, que teria chorado ao fotografar a terrível cena.

Não adianta ouvir a música de Mozart no pequeno aparelho de som que mantenho na extremidade da escrivaninha, em que ora reviso os textos que me chegam dos digitadores.

Fui presenteado pelo amigo Wady Hadad Neto com um computador, mas prefiro escrever em minha Olivetti, Linea 98. Não tenho jeito para lidar com sofisticados aparelhos eletrônicos.

No momento, estou às voltas para equacionar a colocação de trechos de A Casca da Caneleira na antologia que abrange, em ordenação cronológica, textos de nossa prosa (divulgada) ao longo de quase quatro séculos. Coligido e apresentado pelo incansável polígrafo, Jomar Moraes, o citado livro tem a autoria de diversos escritores anônimos, mas sendo uma obra-prima, tudo farei para que o mesmo não fique à margem de minha seleta.

Concentração é impossível. As repercussões da violência nos dias atuais não deixam a gente em paz. Os meios de comunicação a transformam em prato do dia de seus noticiários sensacionalistas. Só se lê nos jornais, só se ouve nas emissoras de rádio, só se vê na televisão, com prioridade e ênfase, casos de crimes hediondos, reportagens estarrecedoras do em moda “Aqui agora”, revoltas em presídios, assaltos a carros de transportes de valores e a agências bancárias, de corrupção cometida por colarinhos brancos, desastre de ônibus (ali no Peritoró, morreram nada menos que 32 passageiros), ou então informes sobre chuvaradas demolidoras no Sul e nevascas insólitas em cidades do hemisfério norte. Tem-se a impressão de que a natureza e o homem estão aliados para fazer da Terra, nosso minúsculo planeta, no contexto do Universo infinito, um campo experimental de calamidades provocadas pelos mais horripilantes tipos de violência, como se os tempos do Apocalipse fossem já a página seguinte do livro da história de povos e nações, no iminente advento do fim do mundo.

É verdade que o homem e a natureza sempre viveram em conflitos, desde Caim e Abel, no dilúvio, em Sodoma e Gomorra, no vandalismo dos Átilas, nas erupções vulcânicas, nas tempestades, nos furacões, nos ciclones, nos terremotos, na arena do Coliseu, onde os romanos, autores das regras básicas do Direito (já prenunciadas no Código de Hamurabi), deleitavam-se com o espetáculo da matança de cristãos lançados às feras, assim como pela cruenta luta entre escravos gladiadores, sacrificados aos clamores: “Ave, Cesar!”.

Tudo isso faz da trajetória em que caminha a humanidade, neste vale de lágrimas, cenário de uma violência rural e urbana sem limites.

Num dia desses, aqui em São Luís, fui apresentado a um coronel reformado, gente de fora, diga-se de passagem. Nosso interlocutor sugeriu-me que eu autografasse um exemplar do meu livro de memórias: Éramos felizes e não sabíamos, no qual a última crônica se intitula Rio de Janeiro dos bons tempos da Lapa.

E querem saber o que me disse aquele brutamontes, quando lhe dei contas de que já não tenho coragem de sair sozinho em ruas da ex-Cidade Maravilhosa? Pois ele me disse que aprendera a matar na guerrilha do Araguaia e que todas as noites, quando lhe é possível, coloca duas magnum na cintura e, como quem nada quer, dá voltas pelos locais mais perigosos do Rio, na caça dos marginais, costumando deixar dois ou três apagados. Vejam a que ponto chegamos!…

Agora mesmo estou ouvindo, em CD, Matthew Passion, de Johann Sebastian Bach, com Orchestra and Choris of Radio Sofia. O sol matinal que entra pela janela do meu quarto, aberta ao nascente, bate com seus raios ardentes minhas costas desnudas.

E que estou a fazer em momento tão agradável? Escrevo minha crônica semanal para O Imparcial, sobre este mal maior do nosso século de modernos inventos, da técnica mais avançada, da ida do homem à Lua, do computador, do telefone celular, da televisão a cabo com antenas parabólicas.

Debita-se a violência à desagregação da sociedade, ao estado de miséria absoluta em que vivem, sabe Deus como, milhões de excluídos dos bens do progresso. Não há dúvida de que as injustiças sociais exacerbam a criminalidade. Mas devemos levar em conta que a violência não é cometida somente pelos favelados e sem-terra. Ela prolifera também no seio das comunidades ricas, burguesas. Nos países capitalistas, os homicídios passionais são praticados em alta escala, enquanto filhinhos de papai, esses garotos irrequietos, estúpidos, drogados, se tornam recordistas em atropelamentos e, raramente, são penalizados pela justiça, em razão das mortes provocadas por eles, dos casos de invalidez decorrentes de suas loucuras ao volante.

Logo que termine esta crônica irei até a sala-de-estar, onde costumo ligar o aparelho de televisão, mais por curiosidade. E, na tela, a contrastar com o encanto dos antigos desenhos animados de Walt Disney, aparecem as cenas de seriados nos quais a violência campeia.

A criançada adora esses combates em que a morte brutal, como conseqüência de atos de falso heroísmo, é tônica desses filmetes, nos quais os efeitos sonoros e a magia das ações movimentadas fantasticamente, pelos recursos da técnica mais avançada, também são manipulados em vídeo-game, com monstros bestiais, figuras assombrosas de extraterráqueos, embora prevaleça, com falso consolo, o chamado final feliz, com a assertiva de que o crime não compensa.

Logo Burnett, com quem convivi, intimamente, nas lides da imprensa e na época em que fomos colegas da rádio Timbira, tem um livro precioso, transformado em aulas de jornalismo. Mais tarde, chefe da editoria do Jornal do Brasil, por certo ele deve ter sofrido muito a aprovar publicação de matérias de notícias sensacionalistas sobre a violência.

Poeta dos melhores de minha geração, às vezes me indago como Lago Burnett conseguia suportar a turbulenta vida carioca, outrora tão amena e lírica, como a experimentei durante quase três anos, tempo em que ali me consagrei mais à boemia do que aos estudos, na segunda metade da década de 40, quando ele não passava de um jovem habitante desta poética cidade de São Luís.

Numa das lições de seu livro de mestre da moderna imprensa Brasileira, Lago Burnett confessa seus desencantos nas situações rotineiras da profissão abraçada. Lamenta que nossos jornais tenham maior circulação quando estampam manchetes como esta “Ressaca devasta Avenida Atlântica”, sem que, noutra circunstância, sejam capazes de imprimir manchete com a seguinte informação:

“Linda manhã de sol em Copacabana”. Quer dizer, a tempestade se sobrepõe à bonança, o feio supera o belo, o mal está acima do bem.

Eisso acontece em parte por culpa dos leitores, enquanto nossos jornais para satisfazê-los, andam trocando as bolas, dando destaque às calamidades e aos crimes e casos de terror, em vez de tecer loas ao bem, ao belo, ao que é edificante.

E, dessa forma, o mundo está ficando do avesso, nossas vidas vão ficando de cabeça para baixo!

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