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sábado, 7 de abril de 2012

JORNALISTAS MARANHENSES - NONNATO MASSON


NONNATO MASSON


Nonnato Masson, nome literário e jornalístico do escritor e jornalista cujo nome de batismo foi Raimundo Nonato da Silva Santos. Nasceu em São Luís, em 28 de fevereiro de 1924. A partir de 1956, começou a exercer o jornalismo profissional como chefe de reportagem e secretário, respectivamente nos jornais Correio da Tarde, O Combate, Jornal do Povo, Pacotilha e O Globo. Ainda em 1956, muda-se para o Rio Janeiro, onde fez parte do corpo redacional do Jornal do Brasil, até 1980, quando se aposentou.

Como redator do Jornal do Brasil, pôde fazer grandes reportagens, tendo viajado pela Europa, Américas e interior do Brasil. Célebre é a série Brasil, Brasis, Brasileiros, de sua autoria.

Em 1961, escreveu para a Revista Fatos e Fotos uma reportagem de fôlego Aventura Sangrenta do Cangaço. Entre 1985 e1990, Nonnato Masson chefiou a sucursal da Empresa Brasileira de Notícias, em São Luís, onde também manteve a crônica semanal Hoje é dia de, no Jornal O Estado do Maranhão. Publicou pelo Serviço de Imprensa e Obras Gráficas do Estado – SIOGE, em 1984, as obras Inês é Morta e Corpo de Moça.

O PÃO ROUBADO

Nonnato Masson
(Jornal Pequeno, 11/08/1957) 

Toma-se o pulso do mundo e sente-se, apesar de não sermos médico, que ele está a precisar de coramina, tal qual o governador do Estado receitou ao Maranhão, após fazer-lhe um diagnóstico de aniversário de um aninho de mando.

Agente que trabalha em jornal quase não percebe, de chofre, que Washington Luís morreu no sanatório, depois de ter sido presidente da República, depois de ter sido exilado, depois de ter tido a rara vergonha do nosso século de não se meter mais em política, refugiando-se em si mesmo e renunciando, em testamento, toda e qualquer honraria que lhe devesse o Estado. Estado, aliás, que, quando vivo era o “de cujos”, nada mais fez do que humilhá-lo e espezinhá-lo. Quase não se nota que Oliver Hardy, aquele fabuloso cômico (“o Gordo”), que vivia em constantes encrencas com Stan Laurel (“o Magro”), dos filmes mudos que nos alegraram a infância, faleceu vítima de paralisia. Assim como chega à redação do jornal, nos pontos e traços nervosos da telegrafia sem fio, desaparece dos nossos pensamentos a notícia de que foi assassinado o presidente da Guatemala e o seu matador suicidou-se após o magnicídio. Quase não se tem tempo para sentir a morte desse poeta brejeiro que foi Bastos Tigre e que nos acostumamos a ler as suas trovas no Almanaque de Bristol. Sabe-se que Zé Lins do Rêgo, de tantos romances que nos plasmaram a formação literária, está entre a vida e a morte, o pensamento não demora (é justo confessar) no seu drama agônico.

Tem-se a certeza de que a gripe asiática paira, ameaçadora, sobre a cabeça do mundo, como se fora uma nova espada de Dámocles, e o fato não nos faz sair da rotina.

Acontece, porém, que a gente sabe que uma menina de 11 anos tenta o suicídio e o episódio nos assalta o sentimento e nos surpreende em todos os sentidos.

Amenina se chama Sônia. Sônia é nome de fada, está nos contos da caronchinha e com essa criança, que dorme em cada um de nós, configura-se o nosso desejo de saber de maiores detalhes acerca do caso de Sônia, pois Sônia poderia ser a nossa irmã caçula, os quindins da mamãe, a alegria da casa, de perninhas grossas, vestidinho curto, fazendo beicinho de malcriação, tão cheia de encanto e malcriação, e despertava depois os risos escondidos dos mais velhos.

Procurando saber, descobrimos que Sônia (Soninha), tendo a mãe viúva e irmãzinha passando fome, num subúrbio do Rio de Janeiro (na faixa da capital da República dos Estados Unidos do Brasil), entrou em uma venda e pediu um pão fiado. O pão com a graça de Deus mataria a fome de sua mãe e de sua irmãzinha. Não sendo atendida, Sônia, réplica menina de Jean VaIjean, que Vitor Hugo fixou nas páginas de Os Miseráveis, roubou o pão. Foi descoberta e a sua situação tornou-se mais terrível do que a do menino Humberto de Campos quando roubou um brinquedo. No Brasil, um pão roubado é coisa mais séria do que um brinquedo roubado. E a dona da venda prendeu Sônia. Envergonhada (e foi isso que nos comoveu, pois Sônia com 11 anos teve vergonha e muita gente barbada não tem nestes brasis imensos), como íamos dizendo, envergonhada Sônia (Soninha) atirou-se da janela do cômodo. Atirou-se à rua, no gesto desesperado, para morrer, para evitar o escândalo, pois ela teve vergonha de ser presa, como ladra, pela Rádio Patrulha, que a vendeira já havia chamado pelo telefone,

Depois de tudo isso, depois desse tremendo drama, o “fantasma voador”, que gere o nosso destino republicano, com uma bateria de fotógrafos, apresenta-se no seu terno mais impecável, com a barriga cheia, os bolsos transbordando, em casa da pobre viúva e da menininha, cuja miséria impulsionara Soninha ao duplo gesto do crime e da morte voluntária, com a promessa de ajudar aquelas criaturas a ter uma vida menos desgraçada.

Étarde! Tarde demais, presidente. Devera Vossa Excelência ter compreendido antes que muito mais importante do que Brasília é o destino dessa multidão de Sônias que existem do Oiapoque ao Chuí, se nos permitem o lugar comum.

Depois do caldo derramado, nada mais adianta. E a vida de Sônia, símbolo da desamparada infância brasileira, está marcada por estigmas indeléveis que toda vossa ajuda não conseguirá remediar.

Eé pena. sabe?

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