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segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Tem cara de 1964, cheiro de 1964, mas é 2012… Ou não?

Melhores publicações semanais do site do Instituto Presidente João Goulart.



publicada em 03 de setembro de 2012
Tem cara de 1964, cheiro de 1964, mas é 2012… Ou não?
Eduardo Guimarães*,
no blog da Cidadania


Além de previsível, por estranho que pareça julgo positiva a nova insubordinação de cerca de cem chefes militares da reserva contra a comandante-em-chefe das Forças Armadas, Dilma Vana Rousseff, que, coincidentemente, é também a presidente da República Federativa do Brasil, eleita em 31 de outubro de 2010 com 55.752.529 votos, os quais contabilizaram 56,05% do total de votos válidos.
Os militares da reserva - que muitos chamam de militares de pijama, mas que adotam discurso grandiloqüente e ameaçador que obriga a duvidar de que sejam só velhinhos mal-humorados - deixam ver que continuam dando tão pouco valor ao voto popular quanto davam há pouco menos de meio século, quando jogaram no lixo outros tantos milhões de votos e puseram o eleito para correr, após o que passaram a impedir que a sociedade expressasse seus desejos políticos devido a que certamente achavam que estes não seriam de seu agrado.
Como na época em que os militares aplicaram seu peculiar conceito de democracia, conceito esse que passava pela nulidade do voto popular, também temos hoje setores da imprensa falando pelos possíveis golpistas, mandando recados ameaçadores a quem a vontade dos brasileiros transmudou em comandante suprema das Forças Armadas.
Um peão que disputa com extensa fila de concorrentes o posto que Carlos Lacerda ocupou um dia, saiu recitando trecho dos Lusíadas em que a personagem de Camões recomenda "cuidado" aos portugueses, e faz isso no mesmo texto em que critica a presidente por ter exigido de cada uma das Forças Armadas que repreenda seus membros inativos e insubordinados.
Este blog vive recebendo comentários iguais. Recentemente, leitor postou que se Dilma tentar aprovar uma lei da mídia os seus amigos militares a derrubarão como derrubaram Jango Goulart. Esse tipo de comentário, neste blog, é freqüente. Alguns dos que postam essas coisas se dizem militares e dão a entender que são da reserva, apesar de que não dão seus nomes.
A diferença desses para o tal colunista é a de que este está ligadão a militares da reserva, aos amigos desses militares na política e, supõe-se - devido à grandiloqüência de suas ameaças -, também aos militares da ativa...
Nesse aspecto, julgo que esse episódio é positivo. Há, na esquerda, uma moçada que não consegue sequer cogitar a hipótese de que hoje os militares ousariam deixar os quartéis para derrubar o governo, fechar o Congresso, estabelecer a censura, prender sem mandado, torturar e assassinar como ocorreu há quase 50 anos e durante os vinte anos seguintes.
Quem está certo, este cinqüentão ultrapassado ou a garotada confiante na força da nossa democracia? Eles que se entendam com o tal colunista que todos sabem que não passa de um boneco de ventríloquo, de forma a descobrirem se a sua ameaça a Dilma é só para contentar idosos preocupados em ter que prestar contas da valentia de há meio século ou se é algo mais.
De qualquer modo, é bom que tenha ocorrido essa insubordinação. Se realmente estivermos em 2012 em vez de em 1964, esses militares terão que baixar a bola, terão que adotar o silêncio a que a opção pela caserna os obriga constitucionalmente. Do contrário... Bem, prefiro nem descrever o contrário.
Neste momento, portanto, há que saber se essas pessoas que o Estado sustenta na aposentadoria podem ou não ser enquadradas nas leis que regem a nação por questionarem a legitimidade do Poder Legislativo para aprovar a Comissão da Verdade e por policiarem as opiniões da superior hierárquica.
De uma coisa podemos estar certos: o desenlace desse episódio revelará se estivemos brincando de democracia no último quarto de século ou se ela é para valer. Se houver o risco de o voto dos brasileiros ser novamente rasgado, pelo menos já iremos escolhendo logo entre lutar ou capitular diante da ditadura até então camuflada, pois é melhor um fim terrível do que um terror sem fim.
(*) Jornalista, integra o Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Pessoa Humana (Condepe)

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