No final de abril de 2007 (está nos jornais de então), um grupo de dez juristas, entre os quais quatro ex-presidentes da OAB, foi recebido em audiência no Palácio do Planalto pelo presidente Lula, a convite deste.
Lula, ainda escaldado pelas três CPIs do Mensalão, que, em 2006, funcionaram simultaneamente e quase o levaram ao impeachment, havia encomendado, por intermédio de seu ministro da Justiça, Tarso Genro, sugestões para mudar o funcionamento daquelas comissões, impondo-lhe limites.
Esquecido do uso que o PT, desde sua estreia no Parlamento, fizera das CPIs, transformando-as em instrumento de desestabilização de governos, Lula queixava-se de seu uso abusivo.
Segundo ele, as CPIs violavam direitos constitucionais, transformavam testemunhas em réus, quebravam sigilos à revelia da Justiça, fazendo da tribuna palanque político – algo que o PT, claro, sempre abominou.
Nunca se soube o que continha o tal estudo, que acabou arquivado. Mas o ponto não é esse. No curso da conversa, Lula, para surpresa de seus interlocutores, pôs subitamente outro tema em pauta: a reforma política. E aí, pela primeira vez, falou da hipótese de convocação de uma mini-Constituinte (esse o termo que empregou) para fazer a reforma política.
Não era um tema inédito, já que objeto de uma PEC no Congresso, de autoria do deputado Miro Teixeira. Mas o governo jamais se manifestara sobre o assunto.
Ao final da audiência, o Planalto registrou o encontro como se o tema houvesse sido levado a Lula – e não o contrário. Alguns jornais noticiaram a ideia como “proposta da OAB”, o que levou seu então presidente, Roberto Busato, a esclarecer, em nota oficial, que o tema já havia sido discutido e rechaçado um ano antes na entidade, por sua inconstitucionalidade.
Na conversa, o presidente queixou-se das dificuldades de aprovar uma reforma política, que todos concordaram necessária. Parou aí a concordância. O presidente explicou que essa Constituinte funcionaria paralelamente ao Congresso, seria integrada não apenas por representantes dos partidos políticos, mas também por cidadãos.
Não entrou em tecnicalidades, até porque não são de seu domínio. Não houve também, da parte dos juristas, surpreendidos com o tema, qualquer comprometimento de levá-lo adiante ou de apresentar estudo ou proposta a respeito, já que o presidente, registre-se, não o solicitara e dera-lhe aparência de mera digressão.
Foi, e isso ficou claro, um balão de ensaio, que, diante das reações, dentro e fora do Congresso, não vingou. Eis que, agora, no calor das manifestações, a presidente Dilma e o PT o repõem como uma ideia da hora, como se correspondesse a um anseio popular.
Mais uma vez, porém, diante das reações – inclusive de ministros do STF -, foi preciso recuar, não se sabe até quando. Mas não há problema: repertório parece inesgotável.
Outra ideia antiga, a do plebiscito para a reforma política, vem à tona, apresentada como nova. Já constava, no entanto, de documento do PT, fruto de uma de suas inumeráveis conferências nacionais ao tempo do governo Lula, posteriormente inclusa no programa de governo que Dilma apresentou na campanha eleitoral e depois suprimiu, em face (também) das reações.
O que fica claro é que o governo, vilão nas manifestações de rua, procura delas tirar proveito, pondo em pauta seu projeto de poder total. Inspira-se no modelo chavista de democracia direta – concebido no Foro de São Paulo (criado há 23 anos por Lula e Fidel Castro), adotado na Bolívia e no Equador -, que torna a participação do Congresso meramente homologatória.
A democracia direta (nada a ver com Estado democrático de Direito) é a velha ditadura populista, sob falsa aparência. Joga no lixo as instituições, o direito dos que se opõem, censura a imprensa e eterniza no poder o mesmo partido.
Qualquer semelhança com o que presentemente se propõe deve-se ao fato de que é o que presentemente se propõe
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